quarta-feira, 9 de junho de 2010

Ex-Titã Ciro Pessoa casa psicodelia e surrealismo em novo álbum


Em uma das paredes da sala de estar de Ciro Pessoa, 52, a primeira a ser vista por quem entra na casa pela porta da frente, ele montou uma espécie de altar suspenso.

Estão ali, emolduradas, fotografias clássicas de Janis Joplin, Pink Floyd, Raul Seixas, David Bowie, Jim Morrison, Jimmy Hendrix, Mutantes --todas elas clicadas entre as décadas de 1960 e 1970.

É justamente desse mural --e quase só dele-- que vêm as referências usadas em "Em Dia com a Rebeldia", segundo álbum solo do artista.

Pessoa ficou conhecido por sua contribuição aos Titãs em início de carreira --ele é coautor de "Sonífera Ilha", por exemplo. Também é fundador da banda Cabine C.

Seu nome está diretamente ligado, portanto, ao rock brasileiro dos anos 80. Mas nada que se ouve no disco novo vem dessa escola.
A rebeldia do título não é um quê --é um quem. Trata-se do apelido com que ele chama a mulher, a designer Carolina Vicentim, 27 anos e "completamente ligada à música dos anos 60".

Há quatro anos, fez a declaração de amor: "Vou gravar um disco pra você e você vai gostar das 12 faixas. Se não gostar de uma delas, eu não lanço". E passou os dois anos seguintes só ouvindo rock dos anos 60 e 70.

A sonoridade já estava definida: rock psicodélico. Precisava encontrar o conceito sob o qual construiria as letras. Assim: racionalmente.

"Sempre fui um artista conceitual", diz. "Zombo da franqueza e da sinceridade, acho artigos arcaicos. Comigo é 'estou indo pra lá e é lá que quero chegar'. Arte não é inspiração, é raciocínio."

Surrealismo

Influenciado por "O Dicionário de Lugares Imaginários", de Alberto Manguel e Gianni Guadalupi, escreveu "Anis", a primeira delas.

O dicionário cataloga cenários irreais em que se passam narrativas clássicas --como Macondo, lugar inventado por Gabriel García Márquez no livro "Cem Anos de Solidão", e a Terra de Oz, do filme "O Mágico de Oz".

"Anis" se passa em uma cidade assim, que flutua "na linha do horizonte, entre o céu e o mar, onde a eternidade mora e se entretém".

"Quando vi a pegada psicodélica musical interagindo com essa letra que se situa na fronteira do sonho, pensei comigo: a psicodelia quer conhecer o surrealismo _mais: quer se casar com ele."

E havia de ser o próprio Pessoa o padre e o juiz do casamento. Nasceram assim o "homem cabeça de pêssego", a "mulher ampulheta", o "sol que brilha à noite" --todas registradas no disco.

O som, ele afirma, preza pela "pureza". "Não sou tropicalista, não misturo nada. A mistura despotencializa, dilui", diz. "Como penso assim, meu procedimento alquímico é o seguinte: rock + rock = rock. E o rock é, sim, uma estética brasileira."

Fonte: Folha Online/Ilustrada

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