sábado, 5 de junho de 2010

Nestrovski lança álbum com músicas de Chico Buarque e CD mais ousado

O cantor Celso Sim e o violonista Arthur Nestrovski em espaço interno da Sala São Paulo


Os dois novos CDs de Arthur Nestrovski foram gravados no verão passado. São simultâneos e, de certa forma, complementares.

Em "Chico Violão", ele dá prosseguimento ao que fizera com a obra de Tom Jobim: disseca músicas de Chico Buarque para ressaltar a beleza delas, não transparecendo qualquer virtuosismo do intérprete ou do arranjador.

Já em "Pra que Chorar", acompanha o cantor Celso Sim e é autor ou coautor de nove das 16 faixas. Isto lhe permite ser ousado nos arranjos e elevar o volume de seu violão.

O primeiro, pela própria natureza do projeto, comove menos do que o segundo. Há algo nele de aula de anatomia. Nestrovski põe no osso as melodias de Chico e expõe suas estruturas. São "antiarranjos", como diz.

Desta forma e sem as letras sendo cantadas --embora, não por acaso, constem no encarte--, perde-se em emoção, mas ganha-se em compreensão das canções.

Em "Futuros Amantes", por exemplo, os acordes repetidos no final apontam para o infinito, como pedem os versos. Em "Embebedado", a execução da melodia aponta para um caminhar torto, o equilíbrio difícil.

Pelo menos metade do repertório não é óbvio, opção louvável e, também, compreensível: o Chico mais sofisticado, das duas últimas décadas, é o menos popular, pois as músicas grudam menos no ouvido.

Nestrovski mostra a complexidade de "Romance", "Iracema Voou", "Outra Noite", e assim indica o quanto podem ser cativantes.

Curiosamente, o disco com Celso Sim parece se inscrever numa empreitada contra a ideia do "fim da canção", verbalizada por Chico à Folha em 2004 --José Miguel Wisnik e Luiz Tatit são outros que integram a missão, de certa forma dispensável, pois Chico não quis dizer que as belas canções vão acabar, e sim a hegemonia do formato.

O repertório de alta qualidade vai de três "lieder" (peças clássicas com letras) do século 19 a criações recentes de Nestrovski, passando por canções brasileiras consagradas como "Antonico" (Ismael Silva), "É Doce Morrer no Mar" (Dorival Caymmi/ Jorge Amado) --a mais bela das 16 faixas-- e "As Rosas Não Falam" (Cartola), que ganha acordes fúnebres na introdução e no final.

Além das já conhecidas qualidades de cantor e violonista, o CD exibe engenhosidade conceitual, com um desacalanto "Canção de Não Dormir" polarizando com um "Acalanto", e duas composições de Nestrovski, "Filme Inacabado" e "Retrato de Uma Senhora", fazendo um par de histórias de amor.

E reforça que, em se tratando de canção, a tristeza ainda é a grande matéria-prima da construção da beleza.

PRA QUE CHORAR
Artista: Celso Sim e Arthur Nestrovski
Gravadora: independente
Quanto: R$ 15
Avaliação: bom

CHICO VIOLÃO
Artista: Arthur Nestrovski
Gravadora: Biscoito Fino
Quanto: R$ 34,90
Avaliação: ótimo

Fonte: Folha Online/Ilustrada

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